texto publicado no portal esquerda
O New Labour - o modelo político em tempos abraçado por Veltroni na Itália - sofreu uma derrota esmagadora. O projecto de Blair de promover e implementar políticas de direita, pressupondo que os eleitores da classe trabalhadora tradicional se manteriam fiéis, morreu em Maio de 2008. Nas eleições locais, a votação dos trabalhistas despenhou-se para 24%, um ponto abaixo dos Liberais Democratas e 20 pontos menos que os conservadores (44%). Dada a dimensão da catástrofe, parece pouco provável que Gordon Brown possa vencer as próximas eleições gerais.
Espantados com Margaret Thatcher, Blair e Brown copiaram as suas medidas para dentro do seu próprio partido, espremendo para fora de si próprios, gota a gota, as velhas ideias social-democratas. Todos se tornaram fundamentalistas do mercado. As desregulamentações e as privatizações tornaram-se um mantra e nos últimos dez anos a divisão social entre ricos e pobres aumentou mais do que sob o governo de Thatcher. A redistribuição da riqueza deixou de estar na agenda trabalhista.
Quando o mercado sofreu uma série de choques - o colapso de um banco britânico coberto de dívidas, o Northern Rock, levou a uma intervenção estatal na forma de nacionalização. Ninguém retirou lições. A ajuda aos ricos através de maiores cortes de impostos, o abandono (sob pressão do Financial Times) de planos para cobrar impostos sobre os bilionários não-domiciliados simbolizaram o regime. O modelo neoliberal atomizou a vida social e política, enfraqueceu a responsabilidade democrática e reduziu drasticamente as margens das possibilidades reformistas dentro do sistema. Depois do 11 de Setembro, as liberdades civis degradaram-se seriamente. Há algumas semanas, Brown e os seus ministros estavam a defender o aumento do período de 42 dias de detenção de suspeitos sem acusação. Os conservadores e os chefes da polícia opuseram-se, achando que eram medidas demasiado draconianas.
O sistema eleitoral britânico ajudou a ocultar o inexorável declínio do apoio popular à agenda blairista. Já não oculta mais. O Imperador do New Labour foi agora exposto sem roupas. O poder pode modelar a "verdade", mas não para sempre. Esta é a lição da derrota trabalhista.
Em Londres, a escolha era clara. Boris Johnson é uma estrela de comédias de TV, uma celebridade conservadora que cultiva cuidadosamente uma imagem ultra-reaccionária. Dada a forma como os políticos se tornaram impopulares em tantas partes do mundo, não é surpreendente que o estatuto de celebridade e a riqueza tenham ocupado o centro do palco. Um patético e ineficaz ex-polícia candidatou-se pelos Liberais Democratas e Ken Livingstone foi o candidato do Labour. Apesar de Livingstone ter ganho as últimas eleições como independente contra o New Labour, decidiu depois fazer as pazes com Blair e voltou ao partido, apesar de manter uma postura independente em relação às guerras do Iraque e do Afeganistão, e de desenvolver a sua própria política externa, convidando Hugo Chávez a visitar Londres.
As eleições para presidente da Câmara de Londres reflectiram o humor nacional. É óbvio que Livingstone cometeu erros. O maior de todos não foi o de receber um excêntrico clérigo muçulmano, enfurecendo a imprensa de direita; foi o de reentrar no curral do Labour. A base da sua popularidade repousava no facto de ele não ser um político manufacturado pelo New Labour. O facto de a margem da sua derrota ser menor do que a média nacional reflecte este aspecto, mas não foi suficiente para salvá-lo. Ele sofreu por estar associado ao governo impopular dos trabalhistas. Se se tivesse mantido independente e atacado os regimes de Blair e Brown, em vez de se deixar fotografar com eles, teria ganho.
Uma cidade onde 70% dos cidadãos se opõem à presença britânica no Iraque será agora representada por um presidente da Câmara pró-guerra. Quem se importa se um milhão de iraquianos morreram desde a ocupação do seu país, que haja três milhões de refugiados e que aquele sofrido país enfrente as mais horrendas condições na sua vida diária. Tudo o que estivava associado ao New Labour foi punido.
Tariq Ali, 4/5/2008
Tradução de Luis Leiria
Espantados com Margaret Thatcher, Blair e Brown copiaram as suas medidas para dentro do seu próprio partido, espremendo para fora de si próprios, gota a gota, as velhas ideias social-democratas. Todos se tornaram fundamentalistas do mercado. As desregulamentações e as privatizações tornaram-se um mantra e nos últimos dez anos a divisão social entre ricos e pobres aumentou mais do que sob o governo de Thatcher. A redistribuição da riqueza deixou de estar na agenda trabalhista.
Quando o mercado sofreu uma série de choques - o colapso de um banco britânico coberto de dívidas, o Northern Rock, levou a uma intervenção estatal na forma de nacionalização. Ninguém retirou lições. A ajuda aos ricos através de maiores cortes de impostos, o abandono (sob pressão do Financial Times) de planos para cobrar impostos sobre os bilionários não-domiciliados simbolizaram o regime. O modelo neoliberal atomizou a vida social e política, enfraqueceu a responsabilidade democrática e reduziu drasticamente as margens das possibilidades reformistas dentro do sistema. Depois do 11 de Setembro, as liberdades civis degradaram-se seriamente. Há algumas semanas, Brown e os seus ministros estavam a defender o aumento do período de 42 dias de detenção de suspeitos sem acusação. Os conservadores e os chefes da polícia opuseram-se, achando que eram medidas demasiado draconianas.
O sistema eleitoral britânico ajudou a ocultar o inexorável declínio do apoio popular à agenda blairista. Já não oculta mais. O Imperador do New Labour foi agora exposto sem roupas. O poder pode modelar a "verdade", mas não para sempre. Esta é a lição da derrota trabalhista.
Em Londres, a escolha era clara. Boris Johnson é uma estrela de comédias de TV, uma celebridade conservadora que cultiva cuidadosamente uma imagem ultra-reaccionária. Dada a forma como os políticos se tornaram impopulares em tantas partes do mundo, não é surpreendente que o estatuto de celebridade e a riqueza tenham ocupado o centro do palco. Um patético e ineficaz ex-polícia candidatou-se pelos Liberais Democratas e Ken Livingstone foi o candidato do Labour. Apesar de Livingstone ter ganho as últimas eleições como independente contra o New Labour, decidiu depois fazer as pazes com Blair e voltou ao partido, apesar de manter uma postura independente em relação às guerras do Iraque e do Afeganistão, e de desenvolver a sua própria política externa, convidando Hugo Chávez a visitar Londres.
As eleições para presidente da Câmara de Londres reflectiram o humor nacional. É óbvio que Livingstone cometeu erros. O maior de todos não foi o de receber um excêntrico clérigo muçulmano, enfurecendo a imprensa de direita; foi o de reentrar no curral do Labour. A base da sua popularidade repousava no facto de ele não ser um político manufacturado pelo New Labour. O facto de a margem da sua derrota ser menor do que a média nacional reflecte este aspecto, mas não foi suficiente para salvá-lo. Ele sofreu por estar associado ao governo impopular dos trabalhistas. Se se tivesse mantido independente e atacado os regimes de Blair e Brown, em vez de se deixar fotografar com eles, teria ganho.
Uma cidade onde 70% dos cidadãos se opõem à presença britânica no Iraque será agora representada por um presidente da Câmara pró-guerra. Quem se importa se um milhão de iraquianos morreram desde a ocupação do seu país, que haja três milhões de refugiados e que aquele sofrido país enfrente as mais horrendas condições na sua vida diária. Tudo o que estivava associado ao New Labour foi punido.
Tariq Ali, 4/5/2008
Tradução de Luis Leiria
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