terça-feira, 27 de novembro de 2007

Dez anos de roubo nos salários ? !


Diz o jornal “Público” que o “Governo deve voltar a falhar este ano a meta de inflação, completando pelo menos dez anos de erros nas suas previsões, de acordo com os dados do Instituto Nacional de Estatística (INE) e com as contas da agência Lusa. Desde 1998, o erro médio da previsão da taxa de inflação que consta do Orçamento do Estado face à inflação efectivamente verificada foi de 0,62 pontos percentuais, sendo que em todos esses anos, com excepção para 2006, a taxa prevista ficou sempre abaixo da verificada”.
Nos últimos dez anos tivemos PS, PSD e CDS no governo. Todos eles se enganaram na previsão da inflação. São todos burros? Talvez não!
Prever a taxa de inflação abaixo do que é realmente esperado tem algumas vantagens, entre elas impor um aumento de salários com perda de poder de compra. Quem não se lembra de que as negociações salariais eram feitas utilizando valores de inflação com referência à inflação passada? Numa tentativa de autodefesa os sindicatos, e muito bem, pretendia repor o poder de compra perdido. Com a introdução da nova moda, a que logo aderiu a UGT, os trabalhadores foram sendo anualmente enganados, ou melhor roubados. Sim, porque os governos tinham, e têm, plena consciência do que estão a fazer! Ou não se pode dizer assim que é muito ofensivo?

sábado, 24 de novembro de 2007

A morte do soldado português, a Austrália e a Polónia

foto de guerra do Iraque em www.huffingtonpost.com/

Um soldado português morreu no Afeganistão. Todos lamentamos a morte desta pessoa, tal como de todas as que morreram no mesmo dia vítimas de uma bomba. A família chora a sua morte - tal como no Afeganistão e no Iraque outras famílias choram os mortos que diariamente, às dezenas e centenas, acontecem.
Os governantes dizem que estava ao serviço do país; parece que isto já se ouvia há 40 anos atrás. Os EUA, se não forem "mal agradecidos", haverão também de dizer qualquer coisa.
Apesar de o soldado ter ido para lá na esperança de acumular uns bons salários ficava bem ao “boss do império” vir elogiar o cidadão do país “sub-contratado” que morreu ao seu serviço.
Na Austrália os conservadores levaram uma “abada”. Os trabalhistas (esperemos que estes não sejam muito parecidos com os seus irmão ingleses) ganharam prometendo retirada de soldados do Iraque, revogação das leis de trabalho conservadoras e assinatura do protocolo de Quioto. É sempre uma boa notícia haver partidos que ganham eleições com programas mais à esquerda do que os anteriores.
Já anteriormente as eleições polacas tinham dado a vitória ao partido que defendia uma retirada do Iraque. Quando os EUA aumentam a sua pressão guerreira, quando se teme uma invasão do Irão, o avanço das posições anti-guerra é positiva. Tanto mais que o movimento dos movimentos anda quase parado.
Só podemos terminar dizendo: Portugal fora do Afeganistão.

Srs Doutores não escondam horrores!

sábado, 17 de novembro de 2007

professor sofre


No primeiro diploma,

Congelaram as progressões,

Acabaram os escalões,

E não dizemos nada.


No segundo diploma,

Aumentam o tempo das reformas,

Mexem com todas as normas,

E não dizemos nada.


No terceiro diploma,

Alteram o sistema de saúde,

Há um controlo amiúde,

E não dizemos nada.


No quarto diploma,

Criam-se informações,

Geram-se várias divisões,

E não dizemos nada.


No quinto diploma,

Passa a haver segredo,

As pessoas vivem com medo,

E não dizemos nada.


Até que um dia,

O emprego já não é nosso,

Tiram-nos a carne fica o osso,

E já não podemos dizer nada.

Porque a luta não foi travada,

A revolta foi dominada,

E a garganta está amordaçada.


(publicado no ocartel.blogspot.com)

segunda-feira, 12 de novembro de 2007

Upgrade da revolução?


As comemorações dos 90 anos da Revolução de Outubro trouxeram aos blogues e à imprensa muita informação, opinião diversa desde os assumidamente comunistas até outros cidadãos de esquerda. Vale aqui afirmar todo o extraordinário significado da Revolução de Outubro, todo o seu positivo impacto mundial, todo o seu galvanizar de uma classe trabalhadora que ganhou consciência de si.
Muito foi dito e muito ficará por dizer. É aqui que, partindo da referência do pensamento marxista, se pode colocar algo mais. Um pequeno contributo, por exemplo, partindo da reflexão sobre o problema do poder – ou seja, qual o poder que os comunistas hoje defendem e qual o seu posicionamento sobre o poder pós Outubro.
Para isso recomenda-se a leitura de “Do Estado, Poder Soviético”, de Lenine.
Começando por afirmar a especificidade russa, o momento concreto e o estado de guerra, é a partir desse livro que se sugerem apenas algumas equações, muito focadas, cuja solução merece trato:
- Poderemos dizer em Portugal que o carácter da nossa democracia (regime que desejaremos implantar) consista, ”primeiro, em que os eleitores são as massas trabalhadoras e exploradas, ficando excluída a burguesia; segundo, no desaparecimento de todas as formalidades e restrições burocráticas nas eleições, e em que são as próprias massas que determinam as normas e o prazo para as eleições, gozando de plena liberdade para revogar os eleitos; terceiro, em que se cria a melhor organização de massas da vanguarda trabalhadora, do proletariado da grande indústria, a qual lhe permite dirigir as mais vastas massas de explorados, incorporá-las numa vida política independente e educá-las politicamente baseando-se na sua própria experiência…”
Os comunistas portugueses defendem todo o poder aos sovietes, exclusão da burguesia do voto? Como se materializa num novo poder as contradições de classe? Anulam-se proibindo a sua expressão eleitoral?
- Na complexidade do actual Estado, poderemos afirmar que “o nosso objectivo é conseguir que cada trabalhador, depois de cumprir a sua tarefa de oito horas de trabalho produtivo, desempenhe de modo gratuito as funções estatais”. Até porque “só nela reside a garantia da consolidação definitiva do socialismo”?
- A “unidade eleitoral primária e a célula fundamental da edificação do Estado é, com o poder sociético, não a circunscrição territorial, mas a unidade económica de produção (a fábrica)”?

quinta-feira, 1 de novembro de 2007

Bertinotti perdeu o copyright


Um interessante texto circula no Bloco de Esquerda. Ele argumenta que "o facto de sermos parceiros na esquerda europeia, de ser importante tomar posição, de se verificar que o governo italiano caminha para o desastre - e que isso tem causas - motiva o expressar de uma breve reflexão que foi enviada à Mesa Nacional do Bloco".

É o trabalho que abaixo reproduzimos.

Luís Fazenda, Carlos Santos e Victor Franco


No final de 2002, o Secretário do Partido da Refundação Comunista de Itália, Fausto Bertinotti, elaborou e divulgou as suas "Quinze Teses para uma Esquerda Alternativa Europeia". Trata-se de uma sequência de enunciados e conclusões, em menos de três páginas. A publicação dessas Teses foi simultânea à reunião em Florença de muitos partidos de esquerda da Europa, sob os auspícios da Rifondazione. O leque ideológico dos assistentes era largo, e a oportunidade não podia ser melhor na véspera do 1º Fórum Social Europeu.
O texto de Bertinotti exerceu uma influência marcante no processo de aproximação e convergência de várias esquerdas no velho continente, apostadas numa luta política comum, sem prejuízo e para além das marcas de identidade de cada uma delas. O movimento e os debates que se lhe seguiram foram um impulso à cooperação europeia, até mais do que a forma a que deu lugar, a European Left (E.L.), hoje congelada a baixíssima temperatura. Vale a pena revisitar esse prontuário a usar e perguntar à actualidade o que pensa dele.
1. Bertinotti, em 2002, apoia-se na análise da globalização capitalista para deduzir o alargamento do campo de contra-hegemonia e de alternativa. "O nascimento e desenvolvimento do movimento de crítica contra a globalização gera um fenómeno de valor estratégico". Esperava-se, e bem, revelar "o elo existente entre o modelo social neo-liberal e a guerra da globalização". O "renascimento da política" passava por aqui. E, de um modo particular, a refundação comunista.
Esta visão estratégica provou, e prova, estar acertada. Desde logo pelo surto do "complexo Iraque" na política mundial cavando o isolamento dos EUA, pelas vagas de protesto social que acelerou em muitas regiões, em especial na América Latina. O sistema de guerra imperialista é o paroxismo do regime global dominante. Como é simples de perceber, o actual cerco à ditadura discordante do Irão, apoiado num argumento de autoridade idêntico ao utilizado no Iraque, quem tem as armas, alimenta o regresso de um movimento mundial pela paz, por sua vez gerador de mais profunda contestação ao neo-liberalismo.
Entretanto, o PRC substituiu a visão estratégica de afrontamento da Casa Branca e satélites por uma deriva de aceitação do "multilateralismo negociado" dos conflitos internacionais. Com várias consequências negativas: obscurece as causas do conflito imperialista, o seu domínio totalizante sob qualquer pretexto, espalha a ilusão de uma "América Democrática" que se seguirá a Bush, e só deita sal nas feridas do mundo. O processo do Império, à falta de rupturas essenciais nos EUA e na Europa, mostrará que o multilateralismo não passa de um carnaval de época, destinado a confundir a opinião pública mundial. Do ponto de vista particular da "refundação do comunismo" trata-se até de uma adaptação inexplicável ao neoliberalismo, mesmo que em versão mitigada: isso é simplesmente uma recuperação burguesa de um pensamento socialista.
2. Espaço à Europa. Bertinotti sublinhava em 2002 que "no seio da política mundial a Europa é, para nós, a dimensão mínima necessária para o renascimento da política das classes populares". Pensava então que o destino europeu se ligava à ultrapassagem da crise da política pela participação das classes subalternas, por um "salto em frente" que poderia agudizar a crise da dominação da globalização capitalista. F.B. teve até o cuidado, fundado, de se demarcar das fragilidades democráticas da Europa actual, porém vincando bem a cultura enriquecida pela luta de classes do continente europeu.
Essa visão levou a um processo, não isento de contradições, de rejeição total do modelo de instituições da União Europeia, de oposição à prevista "Constituição Europeia", em nome de um processo democrático dos povos para outra Carta da Europa. Só esse processo tornou possível que o congresso da fundação da EL tivesse tomado essa posição por unanimidade, em consonância com os movimentos sociais mais expressivos do continente, com excepção da cúpula da Confederação Europeia de Sindicatos. Em consequência, todas as forças da EL reclamaram o referendo para rejeitar o Tratado Constitucional.
Hoje, trata-se de fazer o mesmo pelo Tratado Reformador, irmão gémeo do anterior. Exigir o referendo. Pelas mesmíssimas razões. Sem tirar nem pôr. Contudo, o espectro do jogo da ratificação parlamentar ronda a EL, e isso nada tem a ver com o renascimento da política das classes populares.
3. A crise estratégica do reformismo. Foi tema destas "Quinze Teses" e de muitos outros escritos. As intervenções de 2002/4 de Bertinotti recordam essa zona dura, violenta até, de acusações aos partidos sociais-democratas e afins, culpados de terem "contribuído para a eleição de forças de direita nos EUA e na Europa" no que se chamava "a segunda fase da globalização". F.B. asseverava: "Nós sabemos que as ondas de choque contraditórias dos novos processos mundiais, por um lado a globalização capitalista e por outro lado aquele que propõe que um outro mundo é possível (e necessário) põem dramaticamente em crise a hipótese reformista (…)".
Apesar do autor chamar a atenção de que as forças reformistas se dividem, consolidava a evidência de que essas forças estavam, sob a pressão da globalização, rendidas ao neo-liberalismo.
Ora a "hipótese reformista" é o que governa agora Portugal, Espanha, Inglaterra, Suécia, até a coligação na Alemanha, e a própria Itália, já não falando de outros casos menos distintivos. Não é difícil verificar o avanço da NATO e a retirada de direitos sociais em todos esses países. Não há "hipótese reformista" porque vingou em toda a linha o modelo liberal e "o carácter fundamentalmente regressivo" da globalização capitalista.
A tese demarcatória era e é correcta. Aplicada à Itália de hoje torna a posição do PRC uma caricatura.
Não podemos, contudo, diminuir a importância do assunto. A autoridade dos partidos, a força dos movimentos sociais, não irromperam apenas das contradições objectivas com os interesses das "classes subalternas" mas também do capital de esperança das alternativas – essa é a força subjectiva, da consciência social. A participação gestionária num governo liberal, de "centro-esquerda", pode até ser justificada para impedir males maiores às classes populares mas comete o crime de roubar a esperança numa alternativa social. Umas migalhas não fazem a dignidade numa luta de opostos. Ao acentuar-se a crise estratégica do reformismo mantinha-se um apelo ao reagrupamento das esquerdas políticas e sociais. O PRC ao fazer parte da crise do reformismo produz desmembramento do espaço transformador, divisões, atraso na consciência social.
4. Em 2002, FB entendia não fazerem sentido alianças de governo com os reformistas. Nas "Teses" diz-se expressamente: "O facto de que possa construir-se uma transição procurando uma aliança de governo com os reformistas, facto fixado por uma identidade histórica herdada do passado, sofre um golpe mortal na situação actual". O autor juntava duas reflexões a esta conclusão. A primeira, as forças comunistas não se definiam mais pelo confronto com a social-democracia, isso não era mais um debate na esquerda. Segunda, a crise da esquerda reformista juntava-se à crise dos grupos comunistas tradicionais. O epílogo desta linha de pensamento não podia ser mais categórico: "Sabíamos que a refundação era necessária para reconstruir uma perspectiva revolucionária. Agora damo-nos conta que ela é necessária mesmo para existir". Com tais palavras a participação do PRC no governo Prodi soa a epitáfio.
O afastamento de governos compostos por forças gestoras do modelo liberal, embora reclamando-se de centro-esquerda, seria até uma oportunidade de crescimento da perspectiva refundacionista. E isto porquê? Segundo Bertinotti, não sendo possível qualquer aliança de governo: "O motor para a mudança é então a constituição de um novo movimento operário. A Europa é um dos lugares privilegiados para este tipo de transformação da sociedade capitalista dos anos 2000. É obrigatoriamente o nosso terreno de acção privilegiado".
Quando o ministro do Trabalho do governo italiano, Paolo Ferrero, discute por estes dias com os sindicatos o aumento da idade da reforma dos trabalhadores e a desvalorização das pensões, trazendo na gravata a sua qualidade de dirigente do PRC, não pode haver maior divórcio entre a tese e a vida. O oportunismo assume o zénite. O terreno de acção mudou para o partido. Mas o terreno de acção do movimento operário far-se-á, apesar do PRC, como se vê pela contestação da FIOM (Federação dos Metalúrgicos) às medidas do governo Prodi.
5. Está na altura da esquerda alternativa proceder a clarificações. Não se deve ser adepto de capelas e seitas que embargam o debate entre as esquerdas europeias. Em todo o caso, isso não significa escamoteamento de posições políticas, ponderadas e abertas. A esquerda alternativa tem avançado por reagrupamentos e clarificações. A cada clivagem certa tem correspondido um avanço num movimento plural. Presume-se que o PRC tenha regressado ao perfil e à política habitual do que apelidavam de grupos comunistas tradicionais, e nem de todos. Seguramente, a política não é feita por exorcismos, mas por escolhas. Para quem nunca subscreveu várias teses de Bertinotti, as de 2002 eram suficientes para uma caminhada nova da esquerda alternativa europeia.
As "Quinze Teses", então afirmadas, estão ainda hoje válidas. Lamentavelmente, o seu autor perdeu os respectivos direitos. Nós mantemos essa escolha e trazemo-la ao crivo da crítica. Bertinotti perdeu o copyright.