domingo, 30 de setembro de 2007

Menezes, Sarkozy e Sócrates

Menezes ganhou as eleições do PSD. Menezes inspira-se na política do presidente francês, mas este tem como ídolo José Sócrates. O que fica deste "trio amoroso"?
Para já Sócrates parece ganhar um aliado para a não realização de um referendo ao tratado europeu. Menezes não brinca em serviço, a estabilidade do plano neoliberal europeu em primeiro lugar. Parece que a regionalização e a revisão das leis eleitorais também farão consensos entre eles.
A oposição, como Menezes já prometeu, passará pela transferência total dos serviços públicos para o lucro privado. Sócrates abriu as portas, a direita - cada vez mais extrema - entra por elas.

sexta-feira, 21 de setembro de 2007

Lula, o feitor do capitalismo cruel



Mais um excelente testemunho de Léo Lince publicado no site brasileiro http://www.correiocidadania.com.br





Feitor do capitalismo cruel

O presidente Lula é um pragmático do poder. Como tal, ele navega com desenvoltura no papel de governante mascate, inteiramente afinado com a lógica do horror econômico que, de algum tempo até esta parte, controla as alavancas do poder mundial. Pode ser vaiado em estádios de futebol, mas em platéia de banqueiros o aplauso é certo.

Na recente temporada européia, ele fez questão de reafirmar orgulhoso o seu empirismo radical (não se governa com princípios), ao mesmo tempo em que se ofereceu como artífice da subordinação da economia brasileira aos apetites mais destrutivos do modelo dominante no mundo dos negócios. A natureza e o mundo do trabalho que se cuidem, pois vem mais chumbo grosso.

Exemplo? Perguntado, durante encontro com empresários espanhóis, sobre as condições desumanas do trabalho dos cortadores de cana no Brasil, ele reagiu perguntando se o corte de cana seria mais “penoso” que trabalhar numa mina de carvão. O combustível que alimentou na Revolução Industrial o impulso primitivo do capitalismo, sem dúvida, foi produzido nas condições da mais brutal exploração do trabalho humano e de agressão à natureza. A julgar pelas notícias sobre os mortos por exaustão no inferno verde das plantações de cana de São Paulo, o etanol se candidata a repetir no século 21 a mesma trajetória de horrores.

Segundo o historiador Jacob Gorender a comparação feita pelo presidente “foi extremamente infeliz e injusta, não é digna de um líder de origem operária como ele”. No entanto, mais do que infeliz e injusta, o que a comparação tem de terrível é o seu caráter revelador. Nela, a brutalidade da exploração do trabalhador e a agressão ao meio ambiente aparecem como “destino”, fatalidade natural, e não como escolha política a partir de uma determinada correlação de forças sociais.

A bestial brutalidade da acumulação primitiva, que espantou o mundo e gerou reações como a “lei dos pobres” na Inglaterra, seguida de outras propostas que marcaram o processo civilizatório (filantropia social, sindicalismo, caixas de ajuda mútua, solidarismo cristão, estado de bem estar social, socialismo), retorna com força total no globalitarismo financeiro. Liberta dos inconvenientes do controle social, a essência destrutiva que sempre habitou o cerne do capital é a catástrofe que nos ameaça.

E o presidente mascate, esquecido do seu tempo de retirante, se apresenta para cumprir o papel que lhe cabe na engrenagem infernal. No carvão ou na cana, para não atrapalhar o fluxo dos negócios, o destino do trabalhador, no século 18 ou no 21, é comer o pão que o diabo amassou. É um imperativo categórico para o crescimento, coisa natural e inevitável, a prática que agride o meio ambiente e esfola o trabalhador. Ao governante, como pensa o presidente mascate, resta o papel de apertar as alças do garrote vil.

Alguns estudiosos de outros tempos sombrios, aqueles dominados pela vigência direta do trabalho escravo, lançam luz sobre um aspecto curioso das relações de poder no interior do mecanismo de exploração do trabalho. O feitor mais eficaz, aquele que com mais desenvoltura acionava o chicote, era o ex-escravo. Mudou de lado e, por isso mesmo, está sempre obrigado a renovar as provas de sintonia fina com o senhor. O raciocínio, infelizmente, se aplica ao caso em pauta: o presidente mascate é um feitor do capitalismo cruel.

20-Set-2007
Léo Lince é sociólogo.

domingo, 16 de setembro de 2007

Os comunistas e os acordos de poder


Em http://comunistas.info é publicada uma interessante entrevista com Luís Fazenda, líder da bancada parlamentar bloquista, sobre o problema da participação dos comunistas nos governos. A entrevista também foca o recente acordo com o PS para a CML. Aqui fica a dita, para ler com atenção.

"A perspectiva do socialismo como estratégia pode passar por participações no governo ou não passar. Não há dogma. Depende da análise concreta da situação concreta, da natureza da crise do capitalismo, da predisposição das massas trabalhadoras, da relação de forças internas e externas ao país, entre outros factores."
Comunistas.info: Achas que a participação de comunistas e da esquerda em coligações faz sentido em pleno capitalismo, e sem que primeiro se opere a grande transformação social, económica e política a que chamamos revolução?
Luís Fazenda: A participação de formações marxistas em governos de coligação no quadro do capitalismo não é, só por si, surpreendente. Já nos anos 30 do século passado, esse facto impôs-se com o governo de Frente Popular em França, apontado pela Internacional Comunista como exemplo a seguir para travar o ascenso do fascismo. Não se desconhece toda a imensa controvérsia sobre essa posição, quer antes, quer depois. No geral, essa polémica apenas alimentou o sectarismo e facilitou a vida a aspirantes à burguesia. Convém lembrar que, já antes, com objectivo diferente, o de aprofundar a crise do capitalismo, Lenine não tinha descartado a possibilidade de coligações entre os comunistas, outras alas esquerdas, e social-democratas. O dirigente comunista punha a finalidade de frente única em oposição ao oportunismo ministerialista dos social-democratas em governos burgueses. Tratava-se de situações em que o avanço revolucionário não seria imediato. Essas reflexões pouco passaram disso mesmo devido ao massacre dos comunistas alemães em 19, não sendo o único caso de repressão à ordem dos social-democratas. Não se pode simplificar a história e fazer equivaler situações de parlamentarismo, levantamento revolucionário, ou guerra imperialista. Não o farei aqui. Devo apenas sublinhar que a questão não é nova e que a formulação dos objectivos de um governo de coligação é o seu conteúdo, e que a composição e forma de tal governo só pode ser a garantia desses objectivos. Envolver esta questão no debate entre reforma e revolução só turva a táctica dos partidos. A perspectiva do socialismo como estratégia pode passar por participações no governo ou não passar. Não há dogma. Depende da análise concreta da situação concreta, da natureza da crise do capitalismo, da predisposição das massas trabalhadoras, da relação de forças internas e externas ao país, entre outros factores.
Comunistas.info: Como comentas as diversas experiências em curso no mundo em que os comunistas e outras formações de esquerda participam em soluções de governo, na Europa e no Mundo?
Luís Fazenda: Das experiências enunciadas de participação actual de comunistas em governos formados pela via parlamentar convém talvez deixar para outra reflexão a experiência de governos regionais na Alemanha, Catalunha, Brasil ou Índia. Pontuam aqui realidades muito diferentes, tempo e competências muito diferentes, partidos comunistas eles próprios muito diferentes também. Em todo o caso são governos afastados do núcleo da soberania do estado, portanto não definitórios do perfil dos marxistas face ao poder. Parece que se devem dispensar desta análise os ex-comunistas da Suécia e da Finlândia que renunciaram ao objectivo do socialismo. Faço notar que o Partido da Esquerda da Suécia proclamou como finalidade alcançar o “capitalismo democrático”. Nas condições internacionais actuais, de aguda defensiva das forças socialistas e democráticas, a meu ver, só faz sentido participar em governos de coligação com outras forças e aí dar o sinal dos comunistas, caso esse governo rompa com as políticas neo-liberais e com a máquina de guerra da NATO. Exceptuam-se, claro, circunstâncias, nesta ou naquela zona do globo, em que estados possam atravessar uma formidável convulsão e a prioridade seja a paz imediata e a instauração da democracia. Os marxistas não escolhem aliados em abstracto por mero catálogo ideológico. A luta social pode vir a abrir, em Portugal e em vários países da União Europeia, a possibilidade de um “governo de esquerdas” desatrelado do hegemonismo dos EUA, reestruturando os direitos sociais. Contudo, esse contexto não parece ser próximo. O centro da nossa atenção só pode estar virado para isolar os capitães da finança e os sargentos de escala do poder. A participação dos comunistas sul-africanos no governo do país tem, a meu ver, claramente dois momentos. O primeiro compromisso, sob a égide de Mandela e do ANC, inteiramente justificável e necessário, para consolidar a vitória sobre o regime racista, facto de alcance mundial. Nos últimos anos, lamentavelmente, o PC da África do Sul persiste equivocadamente no poder, sancionando um capitalismo muito agressivo contra os trabalhadores sul-africanos. Nos casos do Brasil e de Itália, ressalvando as imensas características diversas dessas experiências, os comunistas propuseram-se mitigar o neo-liberalismo. Sem sucesso e com desfecho dúbio. O governo francês de Jospin já tinha mostrado o desastre desse ensaio. Especialmente grave é o envolvimento objectivo da Refundação Comunista de Itália na política externa pró-NATO de Prodi.
Comunistas.info: Como aprecias a esta luz as peripécias na formação de uma vereação de coligação em Lisboa? E quais as implicações que a participação ou recusa poderão ter para as fases seguintes do processo político português, nomeadamente quanto à competição das legislativas daqui a dois anos?
Luís Fazenda: A partilha de responsabilidades executivas na Câmara Municipal de Lisboa deriva de uma dinâmica local, no caso do Bloco de Esquerda. O PCP durante muitos anos apresentou a coligação PS-PCP na CML como a prova de que era possível uma aliança nacional entre esses partidos. Mais do que a letra dos documentos vale a interpretação de Carvalhas em muitas entrevistas públicas. Hoje a antiga “prova” passou a “corpo de delito”. O voto dos cidadãos tem demonstrado que crescentemente se separa a esfera autárquica da esfera parlamentar. Julgo que as pessoas vão fazer essa distinção em 2009. Tanto para aqueles que decidiram tomar responsabilidades executivas como para os que o não fizeram no caso autárquico, e sem interferência relevante na disputa das legislativas. Uma coisa é um acordo limitado a algumas políticas da cidade, outra bem distante é uma avaliação sobre o rumo liberal da governação e das alternativas. O Bloco de Esquerda não manipula as autarquias para a política nacional. Creio mesmo que no nosso país é uma temeridade pensar que o espaço autárquico seja privilegiado para alterar a rota geral de qualquer partido. Infelizmente é o espaço mais feudal da política. A desagregação do bloco central de interesses passa muito pelos movimentos sociais, em marco nacional e em frente europeia.

sexta-feira, 14 de setembro de 2007

O caso Renan Calheiros, a boazona e o PT

O caso Renan Calheiros mostra o ponto a que chegou o PT do Brasil. Entre os vários artigos publicados há um elucidativo publicado em http://www.correiocidadania.com.br/content/view/846/45/. É o que passamos a transcrever. Por ironia, publicamos seguidamente a foto promotora da playboy sobre a menina de Renan e um cómico gráfismo sobre o caso.

Escrito por Léo Lince
13-Set-2007

O mau exemplo vem de cima aos borbotões. Para sustentar um morto-vivo na presidência do parlamento brasileiro, o Senado Federal teve que adquirir temporariamente as feições de um sarcófago. Conhecida em outros tempos como câmara alta, a casa funcionou como um curral enlameado, um verdadeiro baixio das bestas.

O voto foi secreto, a sessão foi secreta, os microfones e fios telefônicos foram cortados, os celulares proibidos. Não houve ata escrita ou registros gravados para a história de tudo o que foi dito em tal conclave de anormais. Os patrocinadores e os beneficiários do evento precisavam das sombras para agir com desenvoltura e alcançar o seu desígnio imediato. Conseguiram.

Todos sabem que se o voto fosse aberto e a sessão escancarada o resultado seria outro. Era preciso afastar os olhos do povo e estabelecer uma lacuna no registro histórico para que os maus representantes pudessem operar no contraponto dos anseios da consciência digna da cidadania. Para salvar não apenas o indigitado Renan, mas também o tipo de política que ele bem representa, o Senado Federal entrou na clandestinidade.

No teatro de sombras, rolou de tudo. Os jornais de véspera noticiaram que empresários pressionavam senadores. Não disseram quais, nem precisava. São os de sempre. A malha de cumplicidades que articula o mundo dos negócios com a política de negócios sempre opera na penumbra. Na sessão fechada, o acusado teve condições de distribuir ameaças e chantagens sem quebrar a “omertá”. E, longe dos olhos do cidadão, a bancada do PT adquiriu uma súbita desenvoltura na defesa do seu aliado. A elisão da ótica, como talvez diria o deputado Chico Alencar, facilitou ainda mais o avanço da “ilusão de ética”.

Ainda não se sabe ao certo qual será o desdobramento, no ânimo geral da sociedade, de mais esse tapa na cara da cidadania. O desencanto da massa do povo com a política, que já era grande, tende a aumentar. Ao mesmo tempo, é bom registrar que nas chamadas estruturas intermediárias que organizam minimamente a vida social a reação foi de rechaço e de manifesta indignação ao acontecido. Para estes, o tal “manto de silêncio” não funcionou. Serviu mais para mostrar do que para encobrir e, dependendo do rumo dos acontecimentos, pode virar mortalha para seus patrocinadores e beneficiários.

O circo montado para a fatídica votação secreta do Senado foi uma apoteose da pequena política. O governo jogou pesado. Nomeou para os altos escalões, liberou emendas, colocou seu líder e seu articulador político na tropa de choque. O PT operou de uma maneira no aberto e de outra no fechado. Quando Lula declarou que o importante era respeitar a decisão soberana do Senado, certamente, já sabia do acórdão.

Os vitoriosos com o resultado, execrados pela opinião pública, comemoram envergonhados. Os que perderam caminharão nas ruas de cabeça erguida. As “cartas dos leitores” recolhem o sentimento da cidadania. Os parlamentares que recorreram ao Supremo para furar o bloqueio funcionam como um enclave de vida no parlamento amortalhado. O pequenino PSOL, que desencadeou o processo, já engatilha outros petardos na cartucheira. São, entre outras, expressões do rechaço da sociedade ao tipo de governabilidade que, no episódio em pauta, adquiriu feições na simbiose Lula - Renan.

Léo Lince é sociólogo.
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quinta-feira, 13 de setembro de 2007

A confusão "comunista" e a Festa do Avante


(foto: http://pantanero.blogs.sapo.pt/)
A Festa do Avante é um acontecimento de elevado valor cultural. A ela confluem imensas pessoas independentemente do partido a que pertencem. Deve-se valorizar essa referência.
A festa é também um momento de debate, bem patente no programa deste ano.
Um dos debates mais aguardados foi o que juntou o Partido Comunista do Brasil, no poder com o governo Lula e o PT (também presente), o Partido Comunista da China e o Partido Comunista da Federação Russa. Poderia ter sido um grande debate em torno das questões mais inquietantes nomeadamente quanto à relação dos comunistas com o poder e os programas que rompam com o neoliberalismo e com a guerra imperialista. Mas isso não saiu.
Gostaríamos de ter ouvido de Altamiro Borges, um escritor sempre presente no portal Vermelho, outras palavras sobre a tese de “um governo em disputa” mas sempre legislando cada vez mais à direita que, como cá, faz coisas que nem o anterior foi capaz, que ataca os direitos sindicais e dos trabalhadores, que nega a sempre prometida reforma agrária; gostaríamos de ter ouvido de Altamiro outra informação sobre como se faz uma coligação, o Bloco de Esquerda, com partidos como o PDT que controlam centrais como a direitista Força Sindical ao mesmo tempo que se lança uma nova central sindical sem procurar união de forças do combate dos trabalhadores.
Gostaríamos de ter ouvido do representante chinês outras palavras sobre a democracia na China – a democracia para o povo – enquanto sobe exponencialmente a riqueza de uns poucos, a diferenciação de classes e uma brutal repressão sobre a classe operária… ou sobre o entrelaçamento da China com os EUA e as suas posições conciliadoras (para não dizer um adjectivo mais verdadeiro mais duro) com o belicismo e a guerra opressora.
Noutros lugares, gostaríamos de ter ouvido do representante do MPLA qualquer coisa sobre porque não há eleições em Angola, porque a família Dos Santos enriquece escandalosamente e escandalosamente faz intenção de mostrar a usurpação das riquezas e do esforço do povo angolano, submetido a dura fome, miséria e desemprego, expulso de suas casas (barracas) à frente da tropa de choque para que aí se instalem as novas urbanizações da florescente burguesia angolana.
Só se pode acabar como Sérgio Ribeiro começou o debate “Vivemos um tempo de enganos em que as palavras são úteis para iludir”.

quarta-feira, 12 de setembro de 2007

o segundo Vietname

O império achou que podia controlar o Iraque. Fora do jogo dos sistema capitalista normalizado e do comércio monopolista o Iraque e as suas riquezas eram um pitéu apetecível. Além do mais, as multinacionais tinham dificuldade em integrar o território e a sua economia nos seus lugares de lucro. Bombardear o Iraque não afectava as fábricas da VW, da Intel, da Wallmart…
O ataque foi rápido e mediatizado. As recentes maravilhas da máquina de guerra imperialista desfizeram rapidamente a resistência. As TVs até davam conta de alguns festejos populares.
Mas parece que não há sol que sempre dure. Uma coisa foi ocupar e derrotar militarmente, outra foi exercer um sistema de poder “normalizado” e rapinar eficazmente o petróleo. A pouco e pouco o caos instalou-se. O governo não governava, o petróleo não saía, a crise tornou-se fome , matança, desespero total. Todos contra os ocupantes e todos contra todos.
Caiu a mentira que sustentava politicamente a guerra e a pouco e pouco caíram os aliados dos EUA. Agora até os ingleses falam em retirada – se Brown quizer ganhar as eleições.
A guerra não dá lucro, tornou-se um sorvedouro de dinheiro.
A guerra tornou-se uma derrota militar. Todos os dias caem militares norte-americanos vitimados por bombistas suicidas – uma das novidades desta guerra. Todos os dias as Tvs americanas anunciam que morreram mais uns tantos.
A mediatização dos caixões é tal que o governo proibiu que se filmasse a sua chegada. A mediatização da morte dos soldados é o facto novo que traz a derrota para dentro das portas do centro do império.
Agora as comparações são com o Vietname apesar de ainda ter morrido um décimo dos americanos que morreram nesse país. É a mediatização que marca a diferença.
A derrota é total, militar, política, ideológica, económica.
O problema agora é outro, é como sair, e aí voltam as imagens do Vietname. O problema agora já não é como ficar, é como sair.

sábado, 8 de setembro de 2007

A propósito da propriedade privada


A recente invasão de jovens ecologistas de uma propriedade privada trouxe intensa polémica. A burguesia e seus representantes no poder, no sistema partidário e na imprensa sairam em alvoroço contra tão bárbara agressão. O texto que aqui reproduzimos traz-nos uma abordagem qualificada centrada na


Ideologia da posse


A palavra ideologia é utilizada com vários sentidos na história do pensamento humano. Podemos fazer referência aqui, basicamente, a dois deles e que caracterizam significativamente sua utilização política: a) a ideologia para Marx, como sendo um conjunto de construções teóricas com a pretensão de falsificar a interpretação da realidade e manter situações de opressão; b) a ideologia para Gramsci, designando um conjunto de idéias, crenças e valores que constituem a visão de mundo de um determinado grupo social ou povo. Assim, embora pareça existir uma mera contradição entre as duas compreensões, há características que as unificam, visto que não há uma leitura absoluta da realidade. A ideologia (visão de mundo de um povo) não deixa de ser uma pretensão de verdade, contendo falsificações e, por outro lado, mesmo que as admitamos, não é possível abandoná-las, já que as pessoas não são neutras e seu posicionamento implica uma postura ideológica.
A propriedade é um princípio central da disputa ideológica na sociedade. Para o liberalismo a propriedade é encarada como um direito sagrado do indivíduo e, portanto, interessa sobremaneira sua legitimação em forma de lei para a preservação da ordem social. Um dos principais pensadores ao qual os liberais recorrem para afirmar o direito à propriedade é John Locke, utilizando, principalmente, sua obra Segundo Tratado sobre o Governo Civil. Em Locke encontramos uma defesa da propriedade como resultante do trabalho humano. A função do Estado passa a ser a instituição da garantia de preservação da propriedade: “Considero, portanto, o poder político o direito de fazer leis, para preservar e regular a propriedade” [1]. Para Locke “o homem procura juntar-se em sociedade com outros que já estão unidos, ou pretendem unir-se para a mútua conservação da vida, da liberdade e dos bens que chamo propriedade” [2]. Verifica-se, assim, que, para Locke, a idéia de propriedade se refere à vida, à liberdade e aos bens, sendo que os liberais, em sua leitura, confundem propriedade com bens. Com base no conceito de Locke, a propriedade não necessariamente precisa ser privada, inclusive porque se os bens concentrados não cumprem com o princípio da vida e da liberdade o conceito de propriedade se anula. Locke chega a enfatizar, claramente, a função social dos bens, afirmando que estes pertencem ao indivíduo somente em caso de abundância e de garantia de manutenção da sua boa qualidade para terceiros[3]. Para Rousseau, importante pensador do jusnaturalismo e um dos primeiros críticos sociais, a propriedade configura a origem da desigualdade entre os seres humanos. Através do Estado e do Direito, os burgueses só converteram em lei (convenções) o que antes já possuíam por força (o que não constituía um direito). “O verdadeiro fundador da sociedade civil foi o primeiro que, tendo cercado um terreno, lembrou-se de dizer ‘isto é meu’ e encontrou pessoas suficientemente simples para acreditá-lo. Quantos crimes, quantas guerras, assassínios, misérias e horrores não pouparia ao gênero humano aquele que, arrancando as estacas ou enchendo o fosso, tivesse gritado a seus semelhantes: ‘defendei-vos de ouvir esse impostor; estareis perdidos se esquecerdes que os frutos são de todos e que a terra não pertence a ninguém!”[4].
Mais tarde, Proudhon caracteriza a propriedade como sendo um “roubo” e, principalmente com Marx, o direito burguês da propriedade passa a ser o maior alvo da crítica social. Importante para o debate posterior, entretanto, é a necessidade de regulamentar a propriedade como acessível a todos, ou então, assegurar a sua função social.
Diante do exposto, nos parece impossível conceber a discussão da propriedade como “não ideológica”, já que ela assume uma centralidade na luta de classes e é apresentada como origem do Estado e do próprio arcabouço jurídico. Não podemos, nesse sentido, deixar de discutir os fundamentos do direito de propriedade e seguir aplicando simplesmente o que uma determinada lei prevê, sob o risco de estarmos reproduzindo o ideário jurídico burguês-liberal. É necessário, portanto, construir uma postura crítica do próprio Direito, para que a interpretação jurídica tenha qualquer pretensão de justiça. Ao trazermos a questão da propriedade para a esfera do Direito, no entanto, nos confrontamos com outro conceito, freqüentemente utilizado para determinar ações que se relacionam com a propriedade: a posse. Cabe então uma interrogação: qual é a relação do direito de posse com a propriedade?
A discussão acerca da posse como um direito jurídico nos remete a uma complexidade intrínseca à sua definição conceitual. Segundo Savigny a posse independe da propriedade e sua centralidade está no possuidor. Para Jhering, o que fundamenta o direito de posse é a propriedade privada, contrariando Savigny e apresentando uma abordagem mais progressista da questão. Analisando a etimologia da palavra posse (no latim) essa confere a caracterização de domínio, assenhoramento, dominação e apropriação. Com o decorrer do tempo, o Direito desenvolveu várias compreensões acerca do termo. No Direito germânico medieval, por exemplo, a posse consistia no domínio sobre algo, como sendo um direito real, não sendo admitida a violação da posse sem que, com isso, estivesse pressuposta a violação da propriedade. O Direito romano, por sua vez, separou a posse da propriedade. O Direito Canônico também teve sua participação na construção de um entendimento do conceito de posse, ampliando o campo da aplicação possessória, estendendo-a aos direitos pessoais e “espiritualizando” a posse.
No debate atual cabe a reflexão sobre a manifestação da ideologia nas ações jurídicas acerca da posse e até que ponto isso é negativo ou positivo. Para evitar o reforço à estrutura sócio-econômica de opressão social, a única alternativa viável é romper com a lógica positivista do Direito. No entanto, como parece inevitável a presença da ideologia, também no Direito (já que não há neutralidade entre sujeitos e toda interpretação é subjetiva), é importante pautar o quanto o progresso permanece possível diante do que está dado como lei. Portanto, a pretensão é meramente seguir a lei, para que ela seja cumprida, ou, ao interpretá-la, construir novos sentidos para sua aplicação que podem contribuir para a constituição de leis mais progressistas, estando a sociedade ciente do que elas significam?
O jurista, certamente, tem uma participação importante no estabelecimento de uma lei, a ponto de participar da responsabilidade na sua futura interpretação, alteração ou permanência. Por isso, a consciência da presença da ideologia e a exigência da crítica constante dos elementos fundantes da posse e da propriedade são decisivos na atuação jurídica, de forma que os efeitos da interpretação e da aplicação de leis possam se dar com vistas a uma maior mobilização, organização e participação da sociedade civil. Caso contrário, o Direito permanece conservado como mero aparelho ideológico a serviço da manutenção da desigualdade e da injustiça social.

[1] LOCKE, John. Segundo Tratado sobre o Governo Civil. In: Os Pensadores, 2ª. Ed. São Paulo: Abril Cultural, 1978.
[2] Idem.
[3] Idem, p. 45.
[4] ROUSSEAU, Jean Jaques. Discurso sobre a Origem e os Fundamentos da Desigualdade entre os Homens. In: Os Pensadores, São Paulo: Abril Cultural, 1983, p. 270.

ANTÔNIO INÁCIO ANDRIOLI , http://www.andrioli.com.br/, Professor do Mestrado em Educação nas Ciências da UNIJUÍ - RS. Doutor em Ciências Econômicas e Sociais pela Universidade de Osnabrück – Alemanha


sexta-feira, 7 de setembro de 2007

Jerónimo de Sousa e a Revolução de Outubro


Jerónimo de Sousa foi entrevistado pelo Jornal Público, no dia em que começa uma nova edição da Festa do Avante – uma das maiores manifestações culturais de Portugal e onde se celebrará a Revolução de Outubro.
O Secretário-geral do PCP valoriza as conquistas da revolução. É justa que assim seja. As conquistas revolucionárias foram pioneiras em todo o mundo e um grande avanço civilizacional. A Revolução de Outubro abriu ainda um manancial de esperança que se propagou exponencialmente pelo mundo.
Mas celebrar as conquistas revolucionárias também é resgatar a filosofia e a alternativa de socialista face ao capitalismo. E isso fica sem saída se não declararmos o espírito aberto para a reflexão sobre o que é que correu mal – em verdade, o socialismo caiu.
A persistência no dogmatismo, na negação de evidências como a fusão entre o partido e o Estado, a imposição do partido único – apesar das diferenciações sociais e de classe, o abandono da democracia popular e a sua substituição pela ditadura dos chefes e pelo Estado policial, a criação e o crescimento de uma nova burguesia, guerreira e opressora, a falência da economia ou o desastre ambiental não se coadunam com os princípios marxistas. E desarma-nos para declararmos como hoje a China é um dos expoentes maiores do capitalismo selvagem.
Transformar o ideal comunista numa fé parece-me contraditório com o materialismo histórico e dialéctico. É coisa que não bate certo.
Mas aqui fica a nota.

Extracto da entrevista de Jerónimo de Sousa:
A Festa do Avante! comemora este ano os 90 anos da revolução soviética. O PCP continua a celebrar a URSS?
Noventa anos da Revolução de Outubro, nós continuamos a celebrar um momento histórico em que o ser humano ousou tocar o céu, procurando libertar-se do regime brutal czarista que trazia um povo inteiro na miséria e na opressão. Foi um acto heróico mas também a resposta a uma necessidade objectiva no plano do desenvolvimento social. A obra realizada por essa revolução, a intervenção dos trabalhadores, a ideia de um país atrasado que chegou a ocupar lugares primaciais no concerto das nações, uma revolução que foi capaz de ter um papel decisivo na derrota do nazismo na Segunda Guerra Mundial, os direitos adquiridos pelos trabalhadores: continua a fazer sentido comemorar a Revolução de Outubro e todas as mudanças sociais que se operaram, tanto na União Soviética, como nos países ocidentais próximos, que sentiram necessidade de reconhecer direitos aos seus trabalhadores. Se há alguma lição a tirar, verifica-se que, após a destruição da URSS, houve como um acerto de contas, em muitos países, para recuperar parcelas do domínio perdido, particularmente dos direitos dos trabalhadores.
Acha que o avanço do neoliberalismo é uma consequência do fim da URSS?
Não é uma consequência, mas há mais condições para [o neoliberalismo] avançar, por haver uma correlação de forças profundamente desfavorável aos trabalhadores e aos povos, para recuperar essa parcela perdida no plano dos direitos, dos salários, dos horários. Há aqui uma tentativa de recuperação, em resultado dessa correlação de forças, por desaparecimento do pólo que condicionava o socialismo nesses países.

quarta-feira, 5 de setembro de 2007

EDP e REN, não há vergonha na cara


Os senhores da administração da REN e da EDP retiraram o acesso gratuito dos reformados da EDP e REN aos refeitórios. A moral destes senhores e que não há igualdade entre os reformados, pois os da província não têm refeitórios onde ir comer gratuitamente. Na linha do PS a igualdade para estes senhores é tirar a todos.
Outra saída seria atribuir um subsídio de refeição (+- 5 €) aos reformados que não têm acesso aos refeitórios – claro que isso seria muito caro para empresas tão pobrezinhas e de lucros tão insignificantes.
É simplesmente revoltante ver senhores como o “camarada” José Penedos, presidente da REN ganhar 272.658 € anuais, ter um subsídio de refeição de 2.238 € e como é muito pobrezinho o “camarada” recebe ainda umas despesas de representação de 8.529 €. Quando se reformar terá um pequeno complemento de reforma de 45.443 €. Assim este “camarada” já terá dinheiro suficiente para não precisar almoçar no refeitório e não se juntar com a escumalha trabalhadora.

sábado, 1 de setembro de 2007

Luta contra a precariedade dos enfermeiros


A luta dos enfermeiros é uma luta que interessa a todos os cidadãos pois é uma luta pelo serviço público de saúde. Leia www.sep.org.pt.