Miguel Portas deu uma entrevista à Visão que não desmerece. Muitas das pessoas que navegam na esquerda são uma espécie de “marxistas desarrumados”. É bom que todos os que têm uma referência no marxismo o façam de uma forma aberta e não sectária. E se há necessidade de criticar uma perspectiva dogmática do marxismo também há os dogmáticos, que se dizem anti-dogmáticos, que só de ouvirem falar de expressões como classe se lhes perturba o pensamento.
Mas há uma pequena parte da entrevista que merece um olhar particular:
“O comunismo é uma realidade social e cultural muito marcante do século XX, em muitos países, porque não é só um fenómeno político. Há uma dimensão de crença que se mistura com esperança. Mas o que é crença nuns, é esperança noutros e mistura-se com o que a religião foi, ao longo do tempo: uma estrutura hierárquica com um conjunto de ritos e práticas que consagram a própria doutrinas. Olhe para a festa do Avante. Tem características de encontro entre o mundo rural e o mundo urbano que não têm apenas a ver com a tradição do comunismo, mas com tradições agrárias muito mais antigas e com ritos de encontro que não se explicam pela política. Explicam-se por factores de natureza antropológica que cavam muito fundo nas sociedades humanas. Não foi só o cristianismo que transformou os deuses pagãos em Santos. O comunismo também tem os seus padres, os seus papas. Até os seus Santos. O Marx, o Lenine, o Engels que são se não santos? Do que é que o comunismo é filho se não das grandes tradições do monoteísmo, das mundividências e das grandes esperanças. O comunismo é um produto moderno de uma história muito antiga, da história da luta contra as injustiças”.
É verdade que há pessoas que se consideram comunistas que transformaram o ideal comunista numa religião. O que é contrário ao à própria filosofia marxista. Dogmatizar o comunismo é torná-lo incapaz de responder às mutações da luta de classes e às novas realidade do nosso tempo. Uma das traves fundamentais da nossa filosofia é a análise materialista e dialéctica da realidade social. Ora se esta muda, a análise mudará e – embora mantendo a referência dos princípios de classe – ela encontrará novas ferramentas e novas formas de luta para o proletariado e para o ataque às forças dominantes. Por isso tem sido muito penalizador dos comunistas, em todo o mundo, que e adaptem soluções – certas no tempo de Lenine – mas desadequadas agora. É como sempre usar a mesma solução (um autocolante) para qualquer problema. O capitalismo transformou-se muito e a melhor de prosseguir a luta é continuar interpretar a filosofia para alterar a realidade.
Na verdade não foi o comunismo, enquanto filosofia, que tornou Marx, Lenine ou Engels em santos. Foi o dogmatismo dos que se recusaram, demitiram, ou não souberam pensar como marxistas.
E por isso Miguel Portas não tem razão. Até porque há vários exemplos de comunistas que têm sabido apresentar soluções inovadoras na luta de classes e ajudado a crescer esquerdas combativas e revolucionárias. E, pela experiência nacional e internacional que tem, Miguel Portas sabe bem disso.
O comunismo tem um largo futuro à sua frente. Enfrenta hoje enormes dificuldades, políticas, ideológicas, organizativas (…), em particular na Europa com um forte e largo avanço da direita, da retirada dos direitos sociais duramente conquistados, da ideologia liberal…
Mas encontradas propostas alternativas e mobilizadoras, confiantes numa capacidade dialéctica revolucionária de perceber o capitalismo moderno e o aumento das tensões sociais, os comunistas têm um futuro promissor no seu crescimento. E se a forma como se organizam também é importante (características de partido, tendência, …) a linha política será o determinante.
Àh Miguel, e não é só contra as injustiças, é contra a exploração da pessoa pela pessoa e pelo fim da propriedade privada.
domingo, 13 de julho de 2008
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2 comentários:
Tem gente que acha que ser marxista é apenas ser de esquerda.
Bem, pelo menos esse cara não apoia a China
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