quinta-feira, 7 de junho de 2007

Jerónimo de Sousa, Álvaro Cunhal e a greve geral

O PCP tem estado em bolandas com a greve geral.
Reconhece-se que se empenhou nela – pudera a ordem veio directamente do Secretariado do Comité Central. Mas a evidência da sua extemporaneidade, por mais que Jerónimo grite, não deixa de entrar pelos olhos dentro.
Jerónimo encetou um caminho novo no PCP. Jerónimo sabia que perdia no terreno ideológico – não pela sua ascendência operária, mas porque o PCP perdia as referências marxistas. A aproximação à China, a Cuba, ao Vietname e até à Coreia do Norte ajudou a manter as aparências de que existem referências de poder “comunista” – mas falta o melhor: a resposta materialista e dialéctica à luta de classes hoje.
O controlo dos sindicatos ajudava a manter a identidade partidária: os sindicatos dos trabalhadores – o partido dos trabalhadores. Se os sindicatos são dos trabalhadores e o partido é dos trabalhadores então o partido tem que mandar nos sindicatos ou estes não seriam dos trabalhadores.
O partido tem sempre razão. Quem estiver com o partido, está com os trabalhadores – ou dito de outra forma, quem está com Jerónimo está com o partido e está com os sindicatos e está com os trabalhadores. Quem não está com Jerónimo, não está com a razão, está com a burguesia. É simples!
Portanto, nada mais natural do que sanear deputados, autarcas ou sindicalistas. Os militantes querem-se puros e sem dúvidas na defesa dos trabalhadores, ou seja na defesa dos sindicatos, ou seja na defesa do partido, ou seja na defesa de Jerónimo.
Dúvidas significam caminhos enviesados e caminhos enviesados não se admitem no partido.
E como o partido parece crescer de influência com esta linha ela torna-se ainda mais dogmática.
Os aliados é coisa que nem interessa. É aqui que entra Álvaro Cunhal. Cunhal cultivava a táctica do PCP ter aliados. Mandava mas tinha sempre umas aberturas. Era como na CGTP ou na CNA. A CDU tinha uma certa malta independente. No tempo de Cunhal talvez o Fórum Social Português fosse uma coisa mais ampla – com Jerónimo aquilo era para destruir, e assim foi.
É pois natural que o Secretariado do Comité Central decida e imponha – mesmo aos seus próprios militantes a decisão precipitada de uma greve geral.
A flexisegurança ainda não estava em cima da mesa – não interessa, as novas leis de trabalho ainda não estavam a sair – não interessa, os contratos colectivos e acordos de empresa estavam fechados – não interessa, os novos ainda não tinham sido propostos – não interessa, a presidência portuguesa da união europeia ainda estava para vir – não interessa, o mês de Maio é historicamente o mais difícil para as greves – não interessa, havia pouco tempo de preparação – não interessa, as sondagens davam grande apoio ao governo – não interessa, a classe trabalhadora estava dividida e faltavam instrumentos políticos de unidade – não interessa, a precariedade era e é dominante – não interessa, as condições dos serviços mínimos tinham mudado – não interessa…
Não interessa a unidade da classe, não interessa a evolução da consciência da classe e como ela fica depois da luta, não interessam as condições de oposição e ataque político (ou sequer ideológico) à burguesia, não interessa acumular forças no proletariado…
O que interessa não é a força da razão, é a razão da força. O que interessa não é influir na situação política e a classe ganhar consciência de si.
Parece que o que interessa é ser o campeão da agitação anti-governo. Ou dito de outro modo, o que parece é que é preciso gritar que a oposição é só ele. Isso a burguesia agradece.
Cunhal não devia conseguir tal desiderato!

1 comentário:

Anónimo disse...

Parece a história da formiguinha contada pelo Fafka.
Só de ler ficou com dores de cabeça. Calculo o que terá sido inventá-la!