" 7 DE JULHO DE 2007
EUA x Rússia: unipolaridade em xeque
Gentilezas à parte, o encontro entre George Bush, dos EUA, e Vladimir Putin, da Rússia, no dia 2, terminou como começou, com o mesmo impasse sobre os três pontos de discordância entre as duas potências: a questão do escudo anti-mísseis no Leste Europeu, a independência de Kossovo e o aumento da pressão para que o Irã renuncie a seu programa nuclear.
O principal é o que se refere aos mísseis. E a tensão entre as duas nações já avançou o suficiente para alterar a relação de poder na Europa e recolocar a Rússia em uma posição de força nas relações internacionais, da qual ela havia se afastado desde as décadas de 1980 e 1990, cujo resultado foi o fim do mundo bipolar e o fortalecimento dos EUA como potência única.
É um braço de ferro que cresce desde janeiro, quando Bush anunciou a intenção de instalar um radar e dez interceptadores de mísseis de longa distância na República Tcheca e na Polônia, prontamente aceita pelos governos tcheco e polaco.
A resposta russa veio por partes. Em 23 de maio, Moscou declarou a moratória do Tratado de Forças Convencionais na Europa, baliza das relações entre a Rússia e o continente. Em 29 de maio, anunciou o lançamento do míssil balístico RS-24, para substituir os antigos RS-18 e RS-20. Vai entrar em operação após 2011, é capaz de iludir a vigilância dos radares anti-míssil, transporta 10 ogivas nucleares, e alcança alvos a 6.500 quilômetros. É um grande reforço da capacidade militar russa e, na prática, inviabiliza o escudo antimíssil que os EUA querem instalar na Europa.
Além disso, no início de junho, Putin anunciou que, se o sistema de defesa dos EUA for instalado na República Tcheca e na Polônia, “os mísseis russos voltarão a ser apontados para a Europa”.
Este foi o cenário do encontro entre Bush e Putin em Kennenbukport, no Maine, norte dos EUA. Lá, o item principal do cardápio de Bush foi a pressão sobre o Irã; e o da Rússia, por usa vez, foi o escudo antimíssil.
Não houve acordo. Putin chegou a propor uma ação conjunta para a defesa da Europa, a partir de instalações militares no sul da Rússia, e que seriam dirigidas pelos dois países. Encontrou um Bush irredutível.
Menos de 48 horas, a resposta russa veio no mesmo tom, reiterando aquilo que fora anunciado em junho. "Se nossas propostas não forem aceitas - e não posso descartar essa possibilidade -, a Rússia continuará a explicar, paciente e persistentemente, sua posição a respeito da questão", disse Sergei Ivanov, primeiro vice-primeiro ministro russo e provável sucessor de Putin. "Mas, ao mesmo tempo, estamos prontos para adotar as medidas adequadas para garantir nossa segurança."
Nova guerra fria à vista? Ainda é cedo para responder a esta questão, embora seja possível uma constatação: esta é uma das maiores oposições que a unipolaridade dos EUA enfrenta desde o final dos anos 80".
Este artigo, retirado do portal brasileiro, dá nota de uma interrogação que merece ser analisada, ainda que brevemente.
Os arrufos da Rússia representam um desafio ao centro do poder do imperialismo? Então em que se expressam as divergências Bush – Putin?
Só o facto da recente reunião entre os dois se realizar na casa de praia do papá Bush tem uma mensagem “a gente tá se entendendo, isto vai numa boa. É, tem diferenças – mas nada de mais”.
Na verdade Putin não saiu da pescaria com a família Bush exigindo a saída do Iraque nem do Afeganistão. Putin está querendo ser um importante membro do Conselho de Administração do imperialismo capitalista. Bush quer escudo anti-mísseis – Putin não gosta mas negoceia e propõe o uso conjunto de uma base de radares no Azerbaijão. Bush, apoiando nos governos reaccionários da República Checa e da Polónia que matar dois coelhos de uma cajadada: meter-se bem dentro da Europa – assumindo-se com a NATO como o chefe militar do mundo, coisa que o falido projecto de Constituição Europeia já reconhecia – e, possivelmente, estar mais perto e protegido de conflitos no Leste ou nas regiões árabes.
Mas os arrufos russos também merecem ser vistos à luz dos recentes conflitos em torno da energia com a União Europeia e em particular com a Alemanha e a Ucrânia. A burguesia russa está se agrupando, quer assumir sua parte na exploração dos recursos naturais, quer assumir sua parte na divisão internacional dos lucros. A burguesia russa está fortalecendo-se – e isso implica luta política. E a “coutada” Kosovo poderá ser um negócio menor.
Em Putin não há oposição à unipolaridade norte-americana em primeiro lugar porque Putin não se coloca ao lado dos povos pela paz. Putin é um agressor. Aliás, transparece que a recente pescaria tem como resultado uma maior aproximação no tema do Irão.
Putin não se coloca ao lado dos direitos humanos e da democracia – a Rússia atravessa um processo cada vez mais opressivo sobre o seu povo e cada mais limitador das liberdades.
Putin não se afirma contra o domínio imperial e muito menos contra a política neoliberal. Aliás, a Rússia tem sido exemplo da violência que perpassa na formação da sua burguesia, na acumulação de capital e de propriedade, na execução de uma política económica neoliberal “armada”.
E se alguma dúvida houvesse sobre a política russa, a drástica diminuição da esperança de vida do povo russo aí está a mostrar-nos!
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